13 de dezembro de 2007

Imp(r)ensado

Sem pensar no diz-que-diz (nem me diga),
quis dizer o que viesse, o que me desse na telha;
idéias zunindo - caixa d´abelha.


sai da frente! ninguém segura!
decidi que vai ou racha
nem foi, no final, nem rachou;
não sei bem, no final,
esqueci porque tanta sanha.

6 de dezembro de 2007

Teodoro Bimbão

Faz uns 3 anos, escrevi esse texto, à maneira de Guimarães Rosa. O jornalista Ricardo Noblat publicou-o no seu blog, no carnaval de 2005, e agora eu publico de novo aqui.

Amplíloquo e leonídeo, pensaroso e regalantifônico, Teodoro Bimbão tinha respeiteira e audissonância nas bandas de sua loca. Mirada longiferente e bocarrisoso, dito qualquer dele para os outros era ocasião de palestra, que nem sermão de padre ou discurso de prefeito, mas melhor.
Polissilva, aquelas grotas careciam do que há. Mas povo orgulhoso da sabença de conterrâneo porreta, Teodoro Bimbão esse. E o homem desnegava a quem se achegasse, verbivolente, acolhia bem, dizia o tudo.
Logo à volta já se formava platéia, crianças e velhos, e outros abanando a cabeça em concordância; era bom, era de maravilhar mas assim sossegado, sem susto, a voz aboiada do Bimbão enroninava a gente. "Veracente o olhável, meus filhos, nesses morros daí. Horizonte é de longe pra cá. O morro traça a linha, ou o céu?"
Das vezes brincava: "Neníforo palavranço e vocês estarres como se evangelheceres." Tinha prosa e receita quando da conversa macha de homens: "Mulher rideira dá, dadeira ri." Nem nada era só o dizível, que para atravessar um riacho um dia me falou, "transrivasseremos, nós mesmos do lado de lá, Zeninho?", Zeninho sendo meu nome.
Mas também conhecia dias ruins; certa vez, alguém lhe disse, "bom dia", a modo de educação, e Teodoro tardou a responder, voscilante enfim: "Acelitransluceperambitelumidinhe..." como reza ou rosário, coisas assim que perdia o fio de dizer, ia falando sozinho feito curso d´água, seus olhos desviam.
Sem juízo? Que sabe, doutor que é da cidade. Então ficava muitos dias quieto, parado, nem comer comia. Eu, pra mim, Zeninho somente sendo, Bimbão nem não aluava, mas nele o fio da prosa era comprido, feito que se a gente o joga o balde no poço, mas no Bimbão aquele o poço tinha fundo não, e o fio desenrolava e ia se indo...
A ver, se Bimbão a voz não falhasse e fosse falando o fio todo inteiro comprido que desenrolava lá pra dentro dele, o que é que a gente ouvia? Chegava no fim o quê? O doutor sabe? O falável, dele aprendi; no mundo, tudo são modos de dizença, seu Zeninho, avisou Bimbão, no dia em que saí das barrancas da terra boa da gente a caçar horizontes, carece viver. E certo era; era, doutor sabe?

29 de novembro de 2007

Estúpido

Grassa estupidez da grossa na cabeça; minhas idéias são minhocas lerdas, cegas, perdidas numa mente estreita. Estupidez, um bloco grosso impenetrável duma cera, uma coisa mais coisa. Troco meus passos certos, teimosos da certeza cega da estupidez. Vou aqui, ali, volto; estúpido, mais ainda, mergulho na ignorância, na indiferença. Não está escuro? Não ligo, bocejo; já vai passar, decerto, e nem penso mais em nada, o que era para pensar mesmo? Pois não, seu estúpido pacóvio e tardo, nem se dê ao trabalho de olhar ao lado, o óbvio já te escapa, quem sabe o nem tanto. Estúpido, um espanto.

21 de novembro de 2007

Forma e substância

Existe forma - , ensinava Blutus, o adestrador, ao Grifo, - e existe a substância, sob a forma, incorporada na forma.

- A forma excorpora a substância?, perguntava o Grifo. Sim, de certa forma; Blutus, o adestrador, ficava meio confuso nessas horas, com as perguntas cândidas do Grifo, mas já não usava o chicote, desde que as garras de seu pupilo haviam crescido.

Para arrematar, o Grifo acrescentou - Será então que o pus é a substância da ferida?

Blutus, o adestrador, saiu, como sempre fazia nessas horas, e foi comer um sanduíche dos que trazia em sua sacola; quando era assim, o Grifo aproveitava para brincar entre as árvores.

7 de novembro de 2007

O pior cão do mundo

Eu tive o pior cão do mundo, era um sujeito impaciente, irritadiço, cheio de manias e achaques, mimado, exigente, espaçoso e muito inteligente. Também era capaz dos olhares mais cheios de sentimento que já vi, além de ter um bafo medonho. Foi nosso companheiro mais próximo por doze anos e lá vai; escutou poucas e boas, e disse outras tantas para nós. Eu amei o Bacharel, nós amamos ele lá em casa, e agora penso nele como uma presença. Essa noite escutei ele latir, acordei.

31 de outubro de 2007

grafomania

Esgrimindo tocos de grafite, esfalfa-se em escrevinhar acrósticos e adivinhar crepúsculos.
Freqüenta as graves diatribes da escola, e escolhe a dedo as palavras gráceis, ou grossas.
Dia desses, sem mais chega um e diz a ele:
- Seu grifo, tu és acadêmico?
- Não sei. Grafo pandêmico?
O grifo e o outro ficaram na mesma.

22 de outubro de 2007

Um diálogo crítico

Ado - Jorge Luis Borges não viu isso...
Hugo - O cara era cego, também...
ouvem-se gargalhadas, um arroto, esterores de risos. Hugo sua muito
Ado - Num certo conto que não lembro criticou o escritor fictício que escrevera não apenas "azul", mas "azulengo" e até "azulillo"...
Hugo - E daí?
Ado - Sei lá.
Hugo - O cara era boiola, o velho!
Ado - Só.

19 de outubro de 2007

Ars brevis

Canto de pássaro
Brilho do cristal
Enigma da gota
Mistério d´agora.
Agouro fora de hora.

18 de outubro de 2007

El grifón enumera

Enumeracão de coisas: as driádes andam em duos, os trinados vêm em trinca, as quadrilhas em quartetos. Cinco sempre serão as quinas e os quintais, sêxtuplas são as cestas, claro, e o sexo. As setas e certas cítaras são setenais, os outros talvez sejam oito, como as moitas e as oitivas. Os noves escondem-se em novas e as névoas, desejos e destinos vêm em dez.

16 de outubro de 2007

ao Grifo graforismas e grinfarajens

Grafemos sim, graças sem galhos nem trapaças,
ou o que o valha, ditos de agrafanhotos, a escumalha;
traços toscos que revoltos não dizem nada,
sonhos, poeira, uma rosa ou a swastika.