10 de setembro de 2010

O Noêmio, então, quem diria, pode até ser um cara legal



Noam Chomsky - este era linguista, tornou-se uma espécie de profeta na política, e em ambas as áreas cercou-se de acólitos que não permitem a crítica, que é vista imediatamente como uma forma de profanação a ser combatida. Pode ser coincidência. Ou, como diria G. Gil, não.
Outro dia, estive no blog do Nassif, e teci um comentário em um post sobre Chomsky. Foi a senha para um ataque em bloco; alguém sugeriu que eu "ficasse em meu blog". Vou acatar. Outro disse que eu era Reinaldo Azevedo. Epa, ai não meu chapa, tu não é macho de falar isso na minha cara, foi o que tive vontade de dizer. 
Bem, mas meu problema com Noam Chomsky remonta aos dias longínquos de minha graduação em letras. Sintaxe; a sintaxe era trincheira de Chomsky, e a professora logo avisava.
Fazíamos análise sintática e testávamos hipóteses; no entanto, apenas os nomes das categorias pareciam diversos, porque as relações entre as partes eram estranhamente parecidas, para não dizer que eram iguais. Exceto que desenhávamos diagramas para a análise de frases, em que as unidades eram decompostas, e se chamavam "sintagmas". Diagramas em árvore.
Tive a ingenuidade de perguntar à minha professora qual a diferença entre a análise sintática que tinha aprendido nas antigas gramáticas da escola daquela análise "gerativista-transformacional". A mera pergunta, disse ela, era sinal que eu não estava entendendo nada. Não teve a fineza de me explicar a diferença, contudo; até hoje me pergunto por quê.
Mas o que se há de fazer? Provavelmente tudo isso dever-se-ia à minha própria burrice, que não alcanço as elocubrações do cientista, e faria melhor estando calado. Depois, conversando, ao fim do curso, começo de pós graduação, com os colegas que iam se aventurar nessa área comuniquei minha impressão; ah, responderam, é que você só vai entender a gramática gerativa transformacional no mestrado. E olhe lá.
Ah bom. Deve ser por isso. De qualquer modo, como além de burro sou tinhoso, havia lido os Aspectos da Teoria da Sintaxe e alguma outra coisa. Daí, resumindo, aprendi que a linguagem é uma faculdade inata do ser humano, uma propriedade da mente. Não há ser humano sem linguagem. A verdadeira análise sintática deveria chegar ao imo da estrutura das línguas, de uma tal forma que se veria evidente a estrutura subjacente de todas as línguas, que nada mais seria que a tal faculdade inata do homem, a linguagem ipsa.
Dito isso, a verdadeira análise sintática era, naturalmente, a sintaxe ensinada por Chomsky, dita gerativa-transformacional. Ocorre que, para se chegar a esta estrutura subjacente, seria necessário seguir um programa rigoroso, de análise de quantas línguas fosse possível, sob o modelo gerativo, que logo teríamos uma descrição precisa da capacidade da linguagem. Nada menos. Assombro. Aplausos gerais. Modelo preciso, positivista. As experiências explicarão a natureza da linguagem.
Passaram-se mais de cinquenta anos, e tal não sucedeu. Óquei. Sacudir a poeira.
Sacudiram, o pessoal da gerativa; soube que havia "novas formulações" - da mesma teoria. Got to keep the franchise moving. A teoria não estava "errada". Ela simplesmente havia sido reformulada. A diferença é sutil - tão sutil que chega a me escapar em alguns momentos. Outro dia, alguém me explicou que uma destas reformulações é que a natureza da mente e a linguagem são uma e a mesma coisa. Uau. Não há nada a explicar. Agora, devíamos ter lido Meister Eckhart, em vez de perder nosso tempo com Aspectos da Teoria da Sintaxe.
Não sei se com tudo isso Chomsky ainda é reverenciado nas faculdades de letras. Desconfio que sim, pela reação do pessoal que leu um comentariozinho meu no Nassif. E então? Bem, eu indicaria Meister Eckhardt aos alunos, a natureza da linguagem é outra coisa, meus caros. Essa é uma crítica que há tempos queria fazer; tem também a política. Não é por isso que a gente deixa de ver em Chomsky um americano que fala de política externa sem paternalismo com os não-americanos, sem considerar os outros povos como naturalmente sujeitos ao destino manifesto da América do Norte. Dando uma olhada na rede antes de escrever isso, vi o quanto o velho Chomsky tem de aguentar em seu país por dizer o que acha em política. Que os EUA têm interesses e movem guerras por causa deles. Que a mídia manipula as consciências. Fatos que para nós são corriqueiros, entre os conterrâneos lá dele são causa de escândalo. Como acusar de anti-americano pode soar outdated, ele é ridicularizado. Já dizia meu titio, Deus o tenha, que os EUA são um país fascista, isso nos early sixties.
Então? Isso: concordemos e discordemos do velho Chomsky, cuja filiação mais antiga era a cabala (seu pai era rabino); não é necessário aniquilar nem endeusar o Noam; aliás, de preferência nunca fazer isso com ninguém. Quem diria, ainda finalizo com uma moral, hein?



2 comentários:

disse...

Parece que o pessoal da academia tem medo das coisas simples?

Marcos Vinicius Gomes disse...

Bem, ponto para a coragem do Chomsky que dá a cara a tapa, mas zero pelas análises (na minha inócua opinião) estapafúrdias dele. Também tem um culto exacerbado ao Freud, que parece um santo que é venerado por psicanalistas. Experimente contestar o guru perto de um de seus adoradores e terá: ou o desprezo (isso porque eles não tem nada a acrescentar à 'ciência' psicanálise') ou os argumentos estapafúrdios que são comuns aos seguidores do guru (aquela visão rouseauniana de 'homem selvage', 'mal da civilização') e outras coisinhas que engordam editoras e aumentam o capitalismo cultural.